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O Café na Vila de Itaborahy e sua circulação em Porto das Caixas (Século XIX)

20/01/2015

Gilciano Menezes Costa

Fonte: O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil

A Ilustração apresenta as ruínas de um armazém do século XIX, onde era estocado parte do café que chegava em Porto das Caixas. Antes do advento da ferrovia, esse café era transportado no lombo de mulas, vindo, principalmente, de Nova Friburgo e Cantagalo.

Essa imagem foi produzida por Henrique Cavalleiro, nos anos iniciais da década de 1930, quando este percorreu a região do Porto das Caixas. Representa uma considerável contribuição para se ter uma ideia da dimensão econômica que o lugar possuiu no século XIX, sobretudo em sua primeira metade. [1]

Já em 1715, a região era chamada de Porto das Caixas. Seu povoamento remonta a segunda metade do século XVI e está associado a circulação de tropeiros que desciam a Serra do Mar em busca do acesso ao rio Aldeia. [2]

A prática de empilhar, no porto, as caixas de madeiras que armazenavam os produtos agrícolas, principalmente o açúcar, que eram levados para o Rio de Janeiro por pequenas embarcações a vela, como faluas e saveiros, possivelmente deu a origem do nome Porto das Caixas. A região ao redor do Porto também ficou conhecida por essa denominação.

No século XVIII, embora diversos produtos, como farinha, arroz, milho e feijão, tenham sido comercializados no Porto das Caixas, o predomínio foi do açúcar, seguido de aguardente. No século XIX, além dos produtos agrícolas mencionados, acrescenta-se telhas, carvão de madeira e, com maior força, o café. [3] Desta forma, vale ressaltar que embora a comercialização do café tenha impulsionado expressivamente a economia do Porto das Caixas, o início de seu desenvolvimento econômico é anterior ao século XIX e ocorreu através do escoamento de diferentes produtos agrícolas de várias regiões.

Vindo do extremo norte, o café chegou ao Rio de Janeiro no final do século XVIII. “Da chácara dos frades Barbadinhos, situada no Rio, saíram as primeiras mudas para São Gonçalo e para Resende". As culturas da Baixada se originaram em São Gonçalo e se expandiu até Cantagalo e Madalena. De Resende, o café se desenvolveu para as grandes culturas do Vale Paraíba, Mata mineira e para os chapadões paulistas. [4]

Porto das Caixas, de Arraial virou Curato e em 1856, tornou-se Freguesia da Vila de São João de Itaborahy, com a denominação de Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Porto das Caixas. Era a região menos canavieira da Vila, ligada mais ao café, embora não como produtora, mas sim como intermediária do transporte desse produto.

Seu dinamismo econômico, obtido pela sua condição de entreposto comercial, ocorreu, principalmente, durante toda primeira metade do século XIX e durou até 1866, data em que foi finalizado o prolongamento da Estrada de Ferro Cantagalo em Vila Nova (Itambi).

No século XVIII, já existiam armazéns que recolhiam os produtos agrícolas, enquanto os barcos estavam sendo preparados para transportá-los até o Rio de Janeiro. [5] Com a comercialização do café na região, durante o século XIX, esses armazéns ganharam maiores dimensões. O período entre os anos de 1862 e 1871, representou o momento com o maior quantitativo de armazéns em Porto das Caixas. Os anos 1864 e 1865 se destacaram nesse quantitativo, tendo sido encontrados, em ambos os anos, registros de 8 armazéns. [6]

Em 1934, o renomado poeta Guilherme de Almeida, após visitar Porto das Caixas, relatou a importância de um grande armazém que existiu na região e mencionou que tal armazém era um “descomunal depósito de mercadorias.” [7]

A produção de café na Vila de São João de Itaborahy teve quatro fases. A primeira delas, até 1847, caracterizou-se pelo surto de um novo produto e esteve presa ao dinamismo de Rio Bonito; a segunda, de 1847 a 1860, foi um novo período de crescimento com altos e baixos, após a autonomia de Rio Bonito; [8] a terceira, entre 1860 e 1871, é a fase de estabilidade, onde a produção alcançou seu limite. Por fim, a última fase, de 1871 em diante, período em que ocorreu a decadência do cultivo do café na Vila. [9]

Embora tenha existido alguns lavradores de café em Porto das Caixas, sua produção era extremamente inexpressiva, sendo seu forte a intermediação do transporte desse produto. Na Vila de São João de Itaborahy, o café teve mais expressão em sua freguesia sede, sobretudo nas regiões de Pacheco, Posse, Muriqui, Riachão, Ipitanga, Cabuçu, Pico, Pilões e principalmente no Morro do Chapéu. [10]

O trabalho ao redor do porto era realizado, majoritariamente, pela mão de obra escrava. A urbanização desenvolvida, como consequência da condição de entreposto comercial, diversificou as relações escravistas no porto, gerando a presença de diferentes tipos de escravidão e de escravos que exerciam diferentes ofícios. Assim, era possível encontrar no Porto das Caixas escravos barqueiros, tropeiros, oleiros, tanoeiros, serradores, padeiros, entre outros. A escravidão de aluguel e, principalmente, a escravidão de ganho eram alguns dos tipos de escravidão existentes na região. [11]

O comércio de café contribuiu para que, em 1857, dos 15 portos em ordem de importância econômica, Porto das Caixas tenha se tornado o terceiro com maior destaque econômico da Província. [12] Assim, não foi exagero, quando o respeitável historiador Sérgio Buarque de Holanda escreveu que Porto das Caixas foi um “poderoso entreposto” comercial da Província do Rio de Janeiro. [13]

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Fontes e Bibliografia:

[1] O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil. Rio de Janeiro: Edição do Departamento Nacional do Café, 1934. Henrique Cavalleiro além de ter sido pintor, chargista e ilustrador, foi também professor na Escola Nacional de Belas Artes. Parte de suas obras podem ser localizadas no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro e no Museu Antônio Parreiras, em Niterói.
[2] Autos de livramento de Maria Pinta e sua filha Lourença Dias, em que era autora a justiça, e processados no juízo ordinário de Santo Antônio de Sá, em 1715. Lê-se na folha 23, a declaração feita pela testemunha Antonia Rodrigues de Alvarengua, de ser moradora no lugar denominado Porto das Caixas, distrito da Vila de Santo Antônio de Sá.
[3] Almanaque Laemmert. Província. 1857.
[4] VIANA, Oliveira. Distribuição geográfico do cafeeiro no Estado do Rio. O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil. Rio de Janeiro: Edição do Departamento Nacional do Café, 1934.
[5] ARAÚJO, José de Souza Azevedo Pizarro. Memórias Históricas do Rio de Janeiro. RJ. Edição original, 1820, Imprensa Régia. Livro II, p. 207.
[6] Almanaque Laemmert. Província. 1847-1885.
[7] ALMEIDA, Guilherme de. Porto das Caixas. O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil. Rio de Janeiro: Edição do Departamento Nacional do Café, 1934.
[8] Em 1846, a freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Rio Bonito se emancipou de Itaboraí, sendo elevada a Vila. Coleção das Leis do Império do Brasil. Lei provincial nº 381, de 07 de Maio de 1846.
[9] SANTOS, Ana Maria dos. Vida Econômica de Itaboraí no século XIX. Dissertação de Mestrado apresentada no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense, Niterói. 1975.
[10] COSTA, Gilciano Menezes. A escravidão em Itaboraí: uma vivência às margens do rio Macacu (1833-1875). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Departamento de História, 2013. p. 146.
[11] Idem. pp. 47-181.
[12] Relatório do Presidente de Província. 1857. p. 69. Segundo esse Relatório os portos mencionados em ordem de importância econômica são os seguintes: S. João da Barra, Iguassú, Porto das Caixas, Mangaratiba, Itaguahy, Macahé, Nictheroy, Cabo Frio, Paraty, Estrela, Magé, Jerumerim, Mambucaba, Mauá e o porto da Barra do Rio de S. João.
[13] HOLLANDA, Sérgio Buarque de. João Caetano em Itaboraí. Como um meio enriquecido pelo café suscitou a primeira tentativa de criação de um teatro nacional. O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil. Rio de Janeiro: Edição do Departamento Nacional do Café, 1934.

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Gilciano Menezes Costa é Doutorando em História Social da Cultura na UFF. Professor de História e Filosofia na Rede Estadual em Itaboraí e Professor de História na Rede municipal de Magé. É autor da Dissertação de Mestrado (UFF) intitulada "A escravidão em Itaboraí: Uma vivência às margens do Rio Macacu (1833-1875)". Disponível em: https://docs.wixstatic.com/ugd/5ada89_277b353622e44d018f55ecdb12aa561a.pdf

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